Em-si e Para-si: Experiências e Narrativas na Produção Subjetiva
Você já sentiu que sua identidade muda com o tempo? Este ensaio explora, com base na filosofia de Jean-Paul Sartre, como construímos quem somos. O Em-si representa a parte fixa da nossa identidade, enquanto o Para-si é nossa consciência em movimento, sempre refletindo e mudando. O Ego, ou a ideia que temos de nós mesmos, só ganha sentido quando olhamos para nossa história, mas é o Para-si que nos impulsiona a seguir em frente. Se você já se perguntou "Quem sou eu?", saiba que essa resposta não está no passado, mas no que você escolhe construir no presente e no futuro.
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Por Flávio Sousa
12/9/20243 min ler
Os conceitos de Em-si e Para-si, desenvolvidos por Jean-Paul Sartre, oferecem um arcabouço filosófico robusto para compreender a produção subjetiva do sujeito em perspectiva existencial. No contexto aqui proposto, esses conceitos iluminam a relação dialética entre o sujeito que vivencia e o sujeito que é narrado, abrindo espaço para a análise do Ego enquanto positividade estática e do Para-si enquanto consciência dinâmica e projetiva. Este texto se propõe a explorar a interação entre essas dimensões, situando o sujeito como um construtor de si mesmo em um movimento contínuo entre relato e vivência.
O Em-si: Estática, Positividade e a Essência do Ego
No pensamento sartreano, o Em-si caracteriza-se por sua positividade, ou seja, ele é tão somente o que se mostra em plenitude. Ele “é o que é” e, portanto, não possui possibilidade de transcendência ou de transformação intrínseca. Essa descrição encontra eco na definição do Ego, que, dentro do relato existencial e suas narrativas, surge como uma forma estática e essencial do sujeito.
O Ego é concebido como uma essência que emerge a posteriori: ele não se constrói por si mesmo, mas é continuamente formado e reafirmado pelo Para-si. Esse aspecto essencial reflete o caráter do Ego como algo “puro”, que somente se torna acessível quando descrito ou narrado. Em outras palavras, o Ego só é reconhecido como tal na medida em que é articulado, refletido ou lembrado.
Por esse prisma, o Em-si serve como uma chave para compreender o Ego, pois ambos compartilham a característica de serem objetos — completos em si mesmos, mas incapazes de transcender sua condição sem a intervenção do Para-si. Essa relação destaca a importância do relato e da reflexão no processo de produção subjetiva, onde o Ego, ou Eu, se preferirmos, aparece não como um agente, mas como o “personagem” das narrativas criadas pela consciência.
O Para-si: Projetividade, Consciência e o Autor das Narrativas
O Para-si, por sua vez, diz respeito ao ser humano em seu existir, ou seja, é a dimensão projetiva e dinâmica da existência. Sartre o define como aquilo que "é o que não é e não é o que é", indicando sua natureza como consciência que se lança para além de si mesma, sempre em direção ao futuro. Em contraste com o Em-si, o Para-si é incompleto, pois está constantemente em processo de se tornar.
Na produção subjetiva, o Para-si assume o papel de autor das narrativas. Ele é o agente das experiências vividas, a manifestação ativa da consciência que descreve, reflete e atribui sentido ao Eu. Ao narrar o Ego, o Para-si não apenas reconhece sua própria história, mas também projeta novos significados, continuamente reconstruindo a identidade do sujeito em uma perspectiva existencial.
Essa projeção para o devir ressalta o caráter transformador do Para-si. Ele não se limita a descrever o que foi, mas, ao fazê-lo, também redefine o futuro, criando um ciclo incessante de autorreflexão e autoconstrução. Assim, enquanto o Ego permanece limitado ao que é descrito, o Para-si emerge como o núcleo dinâmico da subjetividade, responsável por dar sentido às experiências e por moldar continuamente o sujeito.
A Relação Dialética entre Em-si e Para-si na Produção Subjetiva
A interação entre Em-si e Para-si é central para compreender a produção subjetiva do sujeito. O Em-si, representado pelo Ego, encapsula a positividade do que já foi narrado e reflete uma identidade estática. Contudo, ele depende do Para-si para ser reconhecido e validado como tal. O Para-si, por sua vez, opera como a consciência que não apenas descreve o Eu, mas também se projeta para além dele, reconfigurando continuamente sua essência.
Essa relação dialética evidencia que o sujeito é simultaneamente o personagem de suas narrativas e também o autor delas. Essa dualidade lhe garante existir como um ser em constante transformação, cuja identidade é tanto um produto do passado quanto uma projeção em direção ao futuro.
Produção Subjetiva como Ato Existencial
A análise sartreana do Em-si e do Para-si revela que a produção subjetiva é um ato existencial, enraizado na tensão entre a estática do Ego e a dinâmica da consciência projetiva. O sujeito emerge dessa dialética como um ser que vive e narra simultaneamente, cuja identidade é continuamente recriada no fluxo do tempo.
Portanto, compreender o sujeito sob essa ótica, exige um olhar atento à interação entre relato e vivência, estática e movimento, essência e transcendência. É nesse espaço de interseção que o sujeito existencial se constitui, refletindo não apenas o que foi, mas também o que ainda pode vir a ser.