O Caos da Imaginação: Quando a Realidade se Dissolve em Nós
Nem sempre é o mundo que nos atormenta – muitas vezes, somos nós que o tornamos insuportável. Construímos histórias dentro da mente, justificamos dores, idealizamos futuros, tememos desfechos que nunca chegam. Mas e se o verdadeiro caos não estivesse lá fora, e sim dentro de nós, na forma como distorcemos a vida com nossa própria imaginação? Neste texto, mergulhamos no labirinto da consciência, explorando como nos perdemos em nossas próprias narrativas e como a psicoterapia pode ser o caminho para reencontrarmos a realidade como ela é.
PSICOLOGIA FENOMENOLÓGICA EXISTENCIALNARRATIVAS EXISTENCIAISCRISE DE IDENTIDADEEXPERIÊNCIA SUBJETIVAVAZIO EXISTENCIAL
Por Flávio Sousa
3/2/20252 min ler
Vivemos entre ruínas imaginárias, arquitetos de mundos que nunca existiram, navegantes de mares que só se revoltam dentro de nós. A realidade, em sua crueza inegociável, jamais foi uma questão de escolha. Mas o modo como a percebemos, sim. Criamos narrativas sobre quem somos, sobre o que merecemos, sobre o que o outro nos deve – e, sem perceber, nos aprisionamos nesses enredos.
A vida, por si só, não exige sentido algum. É nossa consciência inquieta que se debate contra o absurdo de sua própria liberdade, ansiando por algo fixo, definitivo, incontestável. E, na ausência de um destino escrito, a imaginação se infiltra, como um artífice impaciente, criando justificativas para o que nos acontece, heróis e vilões para nossas tragédias, cenários épicos para dramas que muitas vezes são apenas sombras projetadas por nosso próprio medo.
Mas o que ocorre quando o que imaginamos se torna mais real do que aquilo que realmente vivemos? Quando nos identificamos tanto com essas construções internas que passamos a acreditar que somos apenas as histórias que contamos a nós mesmos? O caos não está no mundo, mas na forma como tentamos organizá-lo dentro de nós.
O perigo da imaginação descontrolada não é sua força criativa, mas sua capacidade de nos afastar daquilo que é. O amor pode ser destruído por expectativas irreais; a paz pode ser corroída por medos que nunca se concretizam; a identidade pode se perder em versões idealizadas ou depreciativas de nós mesmos. Perdidos em nossa própria ficção, deixamos de olhar para o real – para o toque, para a respiração, para o outro, para o instante que não precisa de explicação.
É nesse labirinto de projeções que a psicoterapia se torna essencial. Um espaço onde, pouco a pouco, aprendemos a diferenciar o que sentimos do que supomos, o que queremos do que imaginamos querer, o que somos do que tememos ou desejamos ser. O psicólogo não entrega respostas prontas, mas nos conduz ao encontro daquilo que, em meio ao ruído da mente, sempre esteve ali – nós mesmos.
A vida não se encaixa em narrativas perfeitas. E talvez seja justamente essa imperfeição que lhe dá sentido.